Há cerca de 35 anos atrás não existia ainda o conceito de motos “Adventure Touring”. Hoje o conceito está amplamente usado em todas as marcas do mercado e tudo graças à BMW GS.
No ano de 1980 a BMW lançava a primeira GS a R80G/S, uma moto radical e revolucionária na altura, que se tornou um enorme sucesso de vendas que acabou por criar toda uma nova categoria no setor , inspirando outras marcas rivais a desenvolver modelos próprios para esse novo segmento.
Podemos assumir que o projecto se iniciou nos finais dos anos 70 e por desespero de causa pois a BMW lutava pela sua sobrevivência nessa altura competindo com as sofisticadas japonesas de 4 cilindros.
Na realidade nos anos 70 as marcas japonesas, Honda , Yamaha, Suzuki e Kawasaki, que tinham dominado o mercado das cilindradas baixas, começavam a lançar novos modelos de grande cilindrada também. Modelos como as Gold Wing , as XS 750 e 1100, as GS1000 e as Z1300, marcaram toda uma época no final dos anos 70, deixando as bicilíndricas da BMW, com tecnologia clássica e antiquada, arrefecidas a ar e com transmissão por cardã, com pouca expressão no mercado.
Enquanto a BMW lutava pela sobrevivência, tendo começado a desenvolver projetos de motos mais modernas como as da Serie K, de 3 e 4 cilindros longitudinais e injeção eletrônica mas sem capacidade de resposta imediata e a necessitar desesperadamente de se afirmar num mercado já dominado pelas japonesas.
Foi então que uma segunda ideia começou a nascer dentro da BMW. Motos trail de cilindrada média como a Yamaha XT 500 tinham-se tornado populares em utilização todo terreno, embora a BMW nunca tivesse desenvolvido nenhuma moto específica para TT ou Enduro, há muito que estava envolvida na competição, tendo mesmo no início dos anos 70 desenvolvido motos de fábrica com 500cc para competir no campeonato alemão de Todo Terreno e na prova Internacional Six Days de Enduro.
Na realidade, um dos seus pilotos, Herbert Scheck, chegou a ganhar o Campeonato Alemão em dois anos consecutivos, 1970 e 71 e no ano de 1972 decidiu desenvolver a sua própria moto com base na moto da BMW e voltou a ganhar.
Mas foi um caso isolado. Em 1975, um engenheiro da BMW especialista em suspensões, desenvolveu também uma moto de Enduro tendo por base uma BMW R75/5 e participava regularmente nas provas do campeonato nacional.
O conceito começou a ser falado e começaram a aparecer mais pilotos com BMWs a competir nos enduros. Em 1977 o regulamento da competição sofreu uma alteração com a criação de uma classe especial com + de 750cc. Foi aí que o então diretor técnico da BMW, Hans Gunter von der Marwitz encomendou a empresa italiana Laverda a produção de dois protótipos de enduro com base nos motores BMW R60.
Em 1978 , durante a prova de Benetsov, foi possível ver alinhar em simultâneo 3 conceitos de GSs diferentes em motos de Enduro tendo por base os motores R60 já mexidos e melhorados com cilindradas de 800cc. Lá estava Schek com a sua 800, também a Laverda-BMW pilotada por Helmet Pohl da Laverda e Lazlo Peres do departamento de testes da BMW que levava a sua 800 que pesava apenas 142Kg tendo conseguido o 2º lugar no campeonato desse ano na sua categoria.
Entusiasmado pelo sucesso Lazlo Peres viu uma janela de oportunidade de produção de um modelo de fábrica tendo formado uma equipa de desenvolvimento que acabou por criar a primeira G/S , protótipo o qual apelidaram de “Red Devil”.
Era apenas um protótipo, afirmava Peres, que tinha já na altura uma enorme experiência de competição em enduro, razão pela qual os levou a quererem criar algo novo.
A certa altura, por volta de 1979 , uma nova administração confrontou a produção com a terrível decisão de que ou avançavam com o projecto e iniciavam a produção da nova moto ou eventualmente teriam que fechar a fábrica e vender a BMW Motorrad a quem eventualmente estivesse interessado ( Imagine-se … )
Num momento de inspiração e coragem Karl Heinz Gerlinger, Senior Manager, tomou a decisão de avançar com a produção das motos da Serie K e também com o projecto das GS de Enduro de Peres.
O objectivo era de tornar os protótipos em produtos de produção massificada. E foi assim que nasceu a primeira R80 G/S. Uma segunda versão, cinza, já com o escape elevado mas ainda sem o revolucionário Monolever de suspensão traseira, seguiu-se em pouco tempo.
Finalmente em Setembro de 1980, no Show de Colônia, a R80G7S era apresentada. A reacção do mercado espantou a administração da BMW, não apenas pelo entusiasmo demonstrado pelo público em geral como grandes pedidos que se concretizaram durante o evento.
No final de 1981 a BMW tinha produzido um total de 6.631 mais do dobro inicialmente projetado. E uma em cada 5 era uma GS. Tinha nascido uma estrela.
É claro que isto foi apenas o começo pois a o sucesso da GS original não iria durar para sempre. A popularidade não atrai apenas admiradores como também a concorrência.
No decorrer doas anos 80 , e inspirados pelo sucesso das BMW GS e o interesse crescente do Rally Paris Dakar, os fabricantes rivais , tanto do Japão como da Europa, começaram também a produzir motos de enduro de grande cilindrada. Motos como a XLV750R da Honda e logo a seguir a famosíssima Africa Twin e as Suzuki’s DR 750 e Yamaha Super Ténéré, todas fizeram história nos trilhos de mercado abertos pela BMW GS.
O novo conceito de motos passou a ser designado na altura por “ Monster Trails” e tornaram-se super populares. Mas não eram apenas as vendas da GS que a concorrência invejava. O aumento de popularidade do Rally Paris Dakar e a cobertura midiática que o mesmo representava, essencialmente na França, era um manancial de comunicação muito ambicionado por todas as marcas.
O sucesso obtido na competição no Paris Dakar não só significava vendas de versões mais adaptadas a estrada, as vitórias da BMW nos anos de 1981, 83, 84 e 85, provaram essa realidade, como também acrescentavam credibilidade às marcas e uma enorme e efetiva publicidade .
Mas no decorrer dos anos 80, a evolução tecnológica das várias marcas começou a exigir mais potência e capacidade de suportar os trajetos duros do Paris-Dakar. As cilindradas subiram para os 1.000cc já em 1983 e as suspensões traseiras passaram a ser mais efetivas e sofisticadas.
Fruto da experiência ganha em competição a BMW desenvolveu e apresentou em 1987 dois novos modelos da GS. Uma a R80GS e outra a R100GS.
Para além do aumento de cilindrada e potência a grande revolução foi a introdução da suspensão Paralever que reduzia drasticamente o a reação da moto ao torque do motor devido à transmissão por eixo cardã.
Mais evoluções apareceram mais à frente já em 1991 com a montagem de uma carenagem fixa ao quadro. No entanto a grande evolução aconteceu apenas 3 anos mais tarde. Mesmo antes de de se pensar na segunda geração de GSs, estava claro para os técnicos da BMW que o fim estava próximo para os motores boxer arrefecidos a ar de 2 válvulas. Não só a concorrência se estava a tornar mais feroz como a regulamentação ambiental e de ruído estava a estabelecer limites impossíveis de alcançar.
Razão pela qual no início dos anos 90 era já inevitável que a chegada de um motor arrefecido a óleo e de quatro válvulas se viesse a concretizar. A sua chegada concretizou-se em janeiro de 1993 com o modelo R1100RS Sports Tourer e apenas oito meses depois uma versão de Enduro a R1100GS era também anunciada.
Mas o motor com arrefecimento a óleo não era a única boa notícia. O quadro era agora formado por 3 partes diferentes: O motor e a caixa de velocidades formavam o bloco central aos quais se fixavam os sub-quadros anteriores e posteriores. E enquanto que a suspensão traseira era uma evolução da anterior Paralever, a suspensão dianteira era muito mais radical. Em vez de uma suspensão tradicional telescópica, a roda da frente passou a ser controlada por uma revolucionária suspensão apelidada de “Telelever”, uma combinação de suspensão telecópica com braço oscilante…
Mais uma vez, a nova e sobre dimensionada BMW voltou a ser um sucesso de vendas. Na Alemanha, logicamente o melhor mercado da BMW, rapidamente se tornou a quinta moto mais vendida nesse mesmo ano.
Cerca de seis mais tarde e depois de serem vendidas cerca de 40.000 unidades, a R1100GS foi substituída pela R1150GS, uma evolução da anterior com um motor de maior capacidade e potência, uma nova caixa de 6 velocidades e uma série de melhoramentos estéticos algo controversos na altura.
Mas dois anos mais tarde a BMW decidiu lançar a sua primeira versão “Adventure”. Mais uma vez não faziam ideia do sucesso que iriam ter.
Inspirados pelo conceito do Paris Dakar e também pelo crescente mercado de viajantes que elegiam a GS para as suas grande e longas aventuras em 2 rodas, a nova versão Adventure usava uma receita conhecida a seu favor: o conseguir aumentar a sua capacidade off-road aumentando a distância a percorrer sem sacrificar o conforto e capacidade de resistência. Elementos chave contribuiram para essa receita de sucesso tais como o tanque de capacidade de 30 litros, suspensões de cursos superiores e maior capacidade de todo terreno, rodas anodizadas e raiadas de alta resistência, pára brisas mais altos, bancos single mais confortáveis e proteções de cárter mais resistentes e envolventes.
Para divulgação e reconhecimento do seu sucesso contribuíram também os atores viajantes Ewan McGregor e Charley Boorman, que em 2004 se celebrizaram num programa de Tv “Long Way Round” viajando pelo mundo nas suas GS Adventure.
Mas o principal segredo do sucesso da GS reside no fato da BMW ter tido a capacidade de a cada momento chave reinventar a sua máquina dos ovos de ouro e manter a liderança do segmento.
Em 2007, três anos depois do seu lançamento, durante os quais mais de 75.000 GSs foram produzidas , a BMW R1200 GS sofreu novamente um importante upgrade. Seguidos de novos melhoramentos nos anos de 2010 paralelamente ao lançamento de edições especiais.
Chegamos a 2013, oito anos depois do lançamento da primeira R1200GS, uma nova GS é apresentada, desta vez inclui arrefecimento líquido. Como todas as suas antecessoras, o novo modelo é novamente um sucesso. Nos primeiros testes realizados pelas revistas da especialidade a nova GS imediatamente reafirmou a sua liderança sobre as mais competitivas da classe “Adventure” mesmo face a motos como as da KTM e da Aprilia.
Hoje a BMW GS continua a reinar num segmento que criou e desenvolveu há 40 anos atrás, renovando-se ano após ano e mantendo a admiração e o reconhecimento dos seus seguidores e o respeito do mercado em geral.
A BMW GS marcou profundamente a indústria e o setor das 2 rodas e sem a qual tudo teria sido diferente. E uma coisa é certa a renovação continuará.
FONTE: MOTOSPORT