Nações: O que ele viu na Letônia e o depoimento dos brasileiros




Foi um final de semana com temperaturas baixas, vento e com a chuva dando trégua somente poucas horas antes do evento, mas graças ao solo arenoso do local e um excelente trabalho de preparação, a pista se apresentava em perfeitas condições logo no sábado de manhã para se iniciar a prova de mais prestígio do motocross mundial.

Eu aterrissei no país na sexta à noite e com um carro alugado, (inicialmente) sem GPS, logo percebi que a Letônia era bastante diferente dos outros países europeus que visitei no passado: em poucos quilômetros percorridos em busca do hotel, você tem aquela sensação de já ter visto este cenário antes, mais precisamente em um documentário russo de pós-guerra, com o novo sendo construído ao lado do velho, do abandonado; com a falta de sinalizações nas estradas e pouca iluminação nas ruas, também percebi que o povo local não se apresentava tāo amistoso como encontramos nos grandes centros turísticos europeus, porém depois de um sufoco achei o hotel e me preparei para começar um novo dia!

No sábado de manhã, depois de 50 minutos de estrada, cheguei no motódromo de Kegums, retirei minhas credenciais e estacionei o carro no estacionamento reservado para a mídia. Entrando no evento, é impossível não pensar nas provas feitas nos Estados Unidos, comparando os caminhões de fábrica europeus, um tanto mais compactos que os brilhantes Peterbuilts norte-americanos, mas em geral eu diria que a organização do evento foi excelente. Desde as condições oferecidas na sala de imprensa até os banheiros e a plástica da pista – como muitos de vocês acompanharam pela TV, puderam perceber que era muito bonita.

A princípio gostei bastante do traçado: parecia ser bem fluido e não ter nenhum obstáculo de grande periculosidade. No entanto, o solo arenoso desde os primeiros treinos deu indícios de que o maior desafio para os pilotos seria superar a degradação do terreno. Mesmo não sendo muito fā de pistas com pouca elevação natural como esta, tinha consciência de isso como um possível fator benéfico para as motos de menor cilindrada e com o formato do evento, em que as 250s encaram as 450s em duas das três baterias, as provas do domingo automaticamente ficariam muito mais interessantes.

O público compareceu em peso, mas se eu tivesse que comparar com os outros MXoN que participei, diria que o fato da prova se localizar em uma região um pouco mais afastada dos grandes centros europeu fez com que algumas das torcidas mais animadas, com seus capacetes super criativos e as dezenas de ensurdecedoras de motosserras fossem deixadas pra trás.

Aleksandr Tonkov

Nos treinos, a primeira surpresa foi ver Alexander Tonkov – dúvida para o evento depois de uma horrenda queda no México que o deixou com serias queimaduras. O russo subiu de categoria e acelerando a uma FC 350 fez o melhor tempo da classe. Já nas 250s, todos esperavam uma briga entre Jeremy Martin e Tony Cairoli. O italiano bicampeão mundial na classe MX2 começou liderando os tempos com meio segundo de vantagem sobre Martin e dois segundos sobre o inglês Tommy Searle. Na categoria open, quem se deu melhor foi o norte-americano Eli Tomac.

Kevin Strijbos

Durante as provas classificatórias, o belga Kevin Strijbos deu um show de pilotagem na Open e a França começou a mostrar suas garras com a vitória de Gaultier Paulin na MXGP, mas na minha opinião, o mais impressionante foi Tony Cairoli vir de fora dos top 10 para vencer a prova de somente 20 minutos com uma boa vantagem. E o destaque do dia ficou por conta do time estadunidense: apesar de uma prova sólida com a terceira posição de Ryan Dungey, quase foi para a repescagem depois de um horrível capote de Jeremy Martin lhe tirando de contenção do dia, seguida por uma queda na largada de Eli Tomac, que veio de trás para garantir a transferência direta do time para a final.

Brasil

Antes de falar das minhas impressões sobre o domingo, vamos confeir como foi a participação brasileira, na voz dos próprios pilotos:

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Thales Vilardi

Eu corri com uma moto reserva do Philippaerts. Era uma moto original, somente com escapamento. Eu levei meu guidão, suspensão traseira e dianteira para correr. Não tivemos tempo para fazer treinos antes da corrida, porque a Letônia fica bem longe do centro das equipes, e as nossas motos acabaram chegando apenas quinta feira a noite.

A pista de Kegums é um circuito arenoso, de média e alta velocidade. Mas durante o dia a pista foi desgastando muito, muita canaleta em salto, buracos muito grandes. Acho que o ponto mais difícil era encontrar uma linha segura, onde se pudesse atacar mais, colocar mais velocidade, já que a pista “acabou” em todos os cantos.

Na corrida classificatória no sábado, larguei no meio do pelotão, mas me travei um pouco no começo. Consegui recuperar algumas posições e terminar em 22º. Já na final B estava mais à vontade com a moto e com a pista também.

Larguei em 4º, errei na sessão de costelas na segunda volta, perdi algumas posições, e com o decorrer da prova consegui me acertar melhor e recuperar algumas posições. Quando faltavam 3 voltas eu estava a 3 segundos do sexto colocado, que era o japonês Akira Narita, mas minha moto apagou por duas vezes, eu estava em oitavo lugar e acabei terminando em nono . Infelizmente não conseguimos a classificação, todos sabíamos que era uma missão bem complicada. Mas valeu muito a experiência, primeira vez que pude correr o MXON, já que em 2010 eu me machuquei antes de embarcar e não corri.

Gostaria de agradecer ao Cacau e ao Cesinha por todo esforço para ajudar a equipe, todos nossos apoiadores do team brasil, a Subs, Wladas, ASW e a minha equipe Yamaha Geração por me liberar para a corrida.

Rodrigo Selhorst

A adaptação à moto: Foi bastante simples, apesar de ter andado apenas três vezes com uma Yamaha do Thales, tivemos alguns problemas com a embreagem durante o evento, mas fora isso foi 100%. A moto era original.

A preparação não foi do jeito que queríamos, tivemos pouco tempo de treinos. O convite feito pelo Cacau me pegou de surpresa. Mas foquei principalmente em baterias de 20 minutos com velocidade. Parte física com bastante aeróbico e boa alimentação.

A pista: Nunca vi nada parecido, tinha visto alguns vídeos. Porem nada como que estar lá dentro. Para mim foi uma surpresa o quanto a pista ficou difícil, com muitas cavas nas entradas dos saltos! As curvas nada de muito diferente, outra coisa que me chamou a atenção foi a velocidade da pista e o terreno arenoso pesado.

A corrida classificatória: Acabei não largando bem, e consequentemente não conseguindo imprimir um ritmo bom, na metade da corrida a embreagem acabou ficando sem regulagem e não consegui terminar a bateria.

Já a final B, foi bastante divertida, apesar de novamente não largar bem consegui imprimir um ritmo legal e constante, fiz algumas ultrapassagens e também recebi outras, a pista já estava bastante difícil e acabei finalizando em 21º. Saliento, foi muito legal, infelizmente não conseguimos a classificação, mas saímos de cabeça erguida.

Queria realmente agradecer a oportunidade e o convite feito pelo Cacau e o Cesar, era um sonho que tínhamos quando competia profissionalmente e eles juntamente com minha familia, apoiadores e amigos conseguimos realizar. Obrigado a todos vocês. Sem vocês nada disso seria possível.

Roosevelt Assunção

O evento, dispensa comentários né? Haha… Tivemos problemas com os voos, tanto de ida, quanto da volta por causa da greve na Air France. O voo era para ser, São Paulo – Paris – Riga, totalizando umas 15h de viagem. Ai, foi mudado para São Paulo – Catar, Catar Alemanha, Alemanha – Riga e ficamos um total de 34 horas em traslado, foi bem cansativo…

Chegamos lá, as equipes já estavam montando os boxes, logo a estrutura para o time do brasil chegou, usamos a estrutura da JK. Muito boa a estrutura, a moto que eu e o Rodrigo usamos, era da equipe BIKE IT , e a do Thales, era da equipe do Philippaerts, todas Yamaha conseguidas pelo Cacau. A motos eram muito boas, me adaptei bem, mexi muito pouco em acertos de suspensão e o motor era demais… 4 marchas e muito forte.

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A pista era bem arenosa, formava muitas canaletas nos saltos e nas curvas, além de inúmeros buracos, não tinha onde dar uma “relaxada”… Mas sensacional, costelas, mesas, duplo e destruída ao longo dos treinos.

Alguns pilotos top, falaram que nunca andaram em uma pista tão difícil, tensa e destruída como aquela. Nós brasileiros fizemos uma boa atuação, por não termos nada parecido aqui, em termos de pista, andei seguro e me diverti bastante, afinal, estava correndo com os melhores do mundo.

Queria agradecer a todos q nos deram força por redes sociais, e q estiveram com a gente lá , um pessoal de Rondônia, amigo do Rodrigo , leandro Subs , Shell , Popinhak , Cesinha, Café e principalmente ao Cacau, pela oportunidade e toda estrutura , não poderia ter sido melhor!

Observações gerais do domingo:

Gautier Paulin (13) foi o grande nome desta edição do evento. Na foto um “overjump” para tomar a liderança do russo Tonkov

A França: o time francês realmente surpreendeu a todos. Foi indiscutivelmente o melhor e mais consistente do final de semana. Depois de muitas e muitas críticas pela escolha dos integrantes do time – algumas delas inclusive feitas por mim – o técnico francês se despediu da posição com a conquista do Chamberlain Trophy, afirmando na coletiva de imprensa que essa vitória foi fruto de um trabalho realizado com estes pilotos logo no início da temporada (será algo que o Brasil pode aprender por aí?).

Steven Frossard

Gaultier Paulin por tradição tem grandes performances nos Nações e acabou vencendo todas as provas disputadas garantindo o campeonato individual na categoria MX1, mas a surpresa foi a combinação de resultados de Frossard, também lhe garantir o primeiro lugar geral na Open.

Eli Tomac

Os Estados Unidos: com nomes como Herlings, Desalle, Metcalf, Roczen, Ferris e Musquin de fora, tinha quase certeza que os americanos levariam essa pra casa. Quando cheguei na pista e dei uma olhada no terreno, a primeira comparação a vir na minha cabeça foi a parte inferior do circuito de Millville, que seria a parada local do AMA Motocross de Ryan Dungey, na qual Eli Tomac garantiu a sua única vitória da temporada e onde Jeremy Martin literalmente cresceu correndo pois seus pais são os donos da propriedade.

Ryan Dungey

Depois da queda na classificatória de sábado, era claro que Martin não era mais o mesmo, porém a sua condição não foi revelada até a coletiva de imprensa no final do evento, quando o piloto apareceu de muletas e revelou: tinha pequenas múltiplas fraturas no pé direito e também o dedão quebrado em três lugares.

Outro fator, minha opinião, prejudicou bastante o time. O fato de Eli Tomac não ser um grande largador e Ryan Dungey, ao contrário de Tomac, às vezes encontra problemas para fazer provas de recuperação. Isso me faz pensar a estratégia da última bateria do domingo – de deixar Eli com o melhor gate e Dungey totalmente no lado de fora – completamente errada, mas quem sou eu pra contrariar Roger Decoster?

Apesar de tudo, vale a pena mencionar que Eli Tomac pôs uma clinica de pilotagem na última bateria do dia, vindo praticamente da última posição para ameaçar a vice-liderança de Van Horebeek, o que foi realmente incrível. Além disso, vejo essa derrota mais uma vez como uma lição que os EUA não são mais a única força do motocross mundial e com a decisão de Villopoto de cruzar o Atlântico, as coisas não serão tão fáceis como alguns estão achando.

Horebeek faz o holeshot enquanto Tomac compra mais um lote na primeira curva de Kegums

Bélgica: os defensores do Troféu Peter Chamberlain também fizeram bonito e se não fosse por um erro de Kevin Strijbos no inicio da ultima bateria a margem de vitória francesa teria sido muito menor. A campanha de Van Horebeek durante todo o ano fez que a performance do piloto não fosse surpresa, mas o fenomenal desempenho do veterano Strijbos durante todo o final de semana, somado a consistência de Julien Lieber, fez que poucos sentissem a falta do capitão Desalle.

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Dean Wilson

Grã-Bretanha: o time formado pelo escocês Dean Wilson e os ingleses Tommy Searle e Shaun Simpson tinha vaga quase garantida no pódio a não ser pela corrente da moto de Simpson quebrar nas voltas finais da bateria final. Tommy Searle, o destaque do time voltando a acelerar uma 250cc, fez bonito garantindo o primeiro lugar na categoria MX2. Esta prova oficializa a ida de Dean Wilson as motos de 450cc e também marca a sua despedida da Monster Energy Pro Circuit Kawasaki, já que esta semana deveremos ter uma nota de imprensa confirmando a vaga do piloto na Factory Red Bull KTM para a temporada 2015.

Tony Cairoli: fiquei realmente impressionado com a readaptação do piloto na MX2. Antes de cair na primeira bateria do dia, como já mencionei, o italiano dominou os treinos e a sua prova classificatória com certa tranquilidade e, no domingo, mesmo com clara desvantagem, Cairoli já tinha ultrapassado pilotos como Van Horebeek e fazia uma aproximação em Max Nagl, ambos de 450.

A KTM 250cc de Cairoli é reparada após a forte queda na primeira bateria

O piloto afirmou que tinha como objetivo terminar em primeiro entre as 250cc, mas se me perguntarem, Cairoli, com fama de estrategista, jogou tudo pela janela na primeira bateria quando possivelmente notou possibilidades de brigar pelas primeiras posições, resultando em um erro um tanto incaracterístico que lhe tirou de contenção do resto do final de semana.

Arnaud Tonus

A Suécia: os resultados finais não fazem jus a performance do time sueco. Claro, Frederick Noren ficou mundialmente conhecido depois do seu contrato temporário com a America Honda e também fez bonito nos Nações brigando pelos top 10. Além dele, seu companheiro de equipe Filip B**** , um especialista na areia, veio a impressionar, principalmente quando mostrou velocidade para liderar metade da prova classificatória da MXGP no sábado, mas infelizmente acabou cometendo um erro e deixando a vitória nas mãos de Paulin.

Japão: depois da CRF450 de Akira Narita expirar na prova classificatória no sábado de manhã, fiquei um pouco decepcionado do time do sol nascente ficar de fora da final, após uma disputa acirrada com a Irlanda que acabou levando a melhor na corrida de repescagem no domingo de manhã.

Por final…o Brasil: já critiquei, já falei, já quase chorei (não, isso talvez ainda não) sobre a situação e a seriedade que as nossas entidades levam a competição de mais prestígio do motocross mundial. Então só quero mencionar: é realmente triste e bastante frustrante algumas entidades não levarem em consideração o calendário da FIM, antes de montarem o calendário dos seus campeonatos. Mas o importante mesmo é que graças ao meu bom Deus no Brasil ainda existe gente como o Cacau, que mete a cara e faz o negócio acontecer, para representar as cores brasileiras nas olimpíadas do motocross mundial. Meus parabéns também aos pilotos Thales Vilardi, Roosevelt Assunção e Rodrigo Selhorst e toda a delegação brasileira que foram lá e deram o seu melhor contra as maiores estrelas do motocross mundial.

Ahhh…antes que eu esqueça, o Brasil não saiu de lá de mãos vazias, a Youthstream escolheu a prova de Trindade (GO) como o evento com a melhor estrutura do campeonato. Este ano, estive presente na prova brasileira na cidade de Penha (SC) e achei uma prova excelente, enquanto Trindade tive a chance de assistir apenas pela TV. O que eu vi foi muita poeira e arquibancadas bem vazias na segunda bateria, então isso me faz perguntar quais seriam os aspectos levados em consideração pela Youthstream quando avalia suas premiações?

Que venha Ernee no ano que vem!

Vídeo

Team France Storm to Epic Victory at Motocross of Nations 2014

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Frase da semana

“Dont cry because it’s over, smile because it happened.”